Com a eclosão da pandemia da Covid-19 em Moçambique, o Ministério da Saúde definiu novos protocolos e directrizes para reduzir o risco de contaminação nas unidades sanitárias, apesar de, mesmo em tempos de crise, gravidezes e complicações relacionadas ocorrerão, tornando ainda mais importante a existência de serviços para garantir um parto seguro e saudável.
De acordo com o estabelecido no instrumento, as gestantes não podem mais ter familiares ou amigos presentes durante o parto e as consultas pré-natais foram reduzidas para uma vez a cada três meses, com excepção das consultas de emergência.
Rute Armando, nome fictício de profissional com mais de 30 anos de enfermagem e docência em Saúde Materno-Infantil (SMI), teme que traga graves implicações para a saúde da mãe gestante e do bebé, havendo a necessidade de se rever as novas directrizes. “Vamos perder muitas oportunidades para fazer despiste de complicações bem como fazer a monitoria do progresso da gravidez e avaliação da situação materna e fetal. Já foi comprovado que, é possível, de um mês para o outro surgir complicações como a pré-eclâmpsia, malária, anemia, visto que durante a gravidez a imunidade da mulher baixa, vários doenças podem reactivar e num período de três meses pode ser mais difícil contornar algumas situações”, afirma Rute.
Em Moçambique, com uma população baseada em 2,5 milhões de pessoas que podem precisar de apoio como resultado dos impactos do Covid-19, o Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) estima que cerca de 17,000 mulheres grávidas irão dar partos em unidades sanitárias nos próximos três meses. Cerca de 3,500 de todas as mulheres grávidas (dentro e fora das unidades sanitárias) e 4,700 recém-nascidos sofrerão complicações, aumentando a necessidade de acesso aos cuidados obstétricos.
As mulheres grávidas fazem parte do grupo de risco em que a Covid-19 pode se manifestar de forma mais severa. A Covid-19 pode afectar à mulher grávida psicologicamente, aumentando o nível de stress e preocupação, o que durante a gestação pode prejudicar a sua própria saúde e a do bebé. “Há necessidade de se prestar mais atenção na mulher grávida neste período tão conturbado em que o mundo vive. Esta doença afecta a todos mas na mulher grávida pode acentuar a ansiedade e o stress descontrolam todo o organismo da mulher”.
Pré-natal como forma de mitigar complicações
A mulher deve fazer a primeira consulta pré-natal logo no início da gravidez, abrir a ficha e começar a fazer o controlo de modo a evitar complicações. Rute Armando acrescenta que as consultas de pré-natal são importantes tanto para a mãe gestante como para o próprio bebé, porque é durante as consultas onde o técnico de saúde faz o despiste possíveis problemas e complicações que podem surgir. Rute avança que é nesta fase onde a mulher recebe orientações de como se cuidar durante a gestação.
Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda, no mínimo, seis (6) consultas pré-natais, uma no primeiro trimestre, duas (2) no segundo e três (3) consultas no terceiro trimestre. O Ministério da Saúde recomenda consultas mensais ate a trigésima semana, depois as consultas passam a ser quinzenais e no ultimo mês o controlo deve ser semanal até a data do parto.
Durante as consultas a mulher grávida é submetida a uma serie de procedimentos para garantir que a gestação ocorra sem grandes riscos. Os procedimentos incluem o histórico obstétrico, despiste de riscos e de alto risco de morte, despiste de sífilis, aconselhamento para teste de HIV, suplementação de sal-ferroso e acido fólico, tratamento presuntivo e intermitente da malária, desparasitação e vacinação anti-tetânica. Tendo em conta a complexidade dos procedimentos, a monitoria da mulher grávida torna-se mais eficiente quando feita mensalmente, havendo necessidade de uma maior atenção quando a mulher é seropositiva, visto que esta deve seguir com o Tratamento Antiretroviral (TARV) como forma de evitar a transmissão vertical do HIV.
Caracterizada por um curto período de incubação (8 a 12 dias), a Malária na mulher grávida é constitui um grande perigo, a doença pode evoluir causando a destruição dos glóbulos vermelhos e provocando a anemia e enfraquecimento da barreira placentária e desta forma atingir o feto. Em situações mais graves, a malária pode causar aborto, prato prematuro, nado-morto e provocar a morte da mãe. Em Moçambique, as mulheres grávidas são o único grupo que faz a prevenção da malária, dada a gravidade da doença nesta fase.
Como forma de mitigar possíveis complicações durante a gestação, no contexto da Covid-19, o Ministério da Saúde aconselha a todas mulheres grávidas prestem atenção nos sinais de risco e se dirijam de imediato ao posto de saúde mais próximo se apresentar algum sinal de risco. Entretanto, a enfermeira Rute alerta “há sinais de risco que a mulher grávida pode não conseguir detectar, como é o caso da hipertensão silenciosa, dai a necessidade de medir a tensão mensalmente”.
A pré-eclâmpsia é caracterizada pelo aumento da pressão arterial, presença de proteínas na urina, e inchaço do corpo devido a retenção de líquidos, dor de cabeça intensa, zumbido nos ouvidos e visão turva, pode ser difícil de ser identificada pela gestante. A pré-eclâmpsia pode evoluir para a eclâmpsia caracterizada pelo comprometimento cerebral e aparecimento de convulsões generalizadas e coma, podendo levar à morte da mãe e do bebé.
Moçambique apresenta alto índice de mortalidade materna
A Saúde Materno Infantil (SMI) continua a ser um problema em Moçambique. Estima-se que 1 em cada 4 mães fica sem acesso à assistência especializada em obstetrícia durante a gestação e o parto (OMS Observatório Global de Saúde, 2016). Moçambique continua a registar 13 mortes maternas por dia, ou pouco mais de 4500 por ano, cifra considerada das mais elevadas da região subsaariana de África e do mundo. Os números de mulheres que perdem a vida devido a complicações do parto são tidos como altos.
Segundo estatísticas oficiais da ONU, a taxa de mortalidade materna em Moçambique é ligeiramente alta. De acordo com o inquérito demográfico e de saúde, realizado em 2011 no País, a taxa de mortalidade materna é de 408 mortes por 100 mil nados-vivos. Isto significa que, todos os anos, cerca de 4.500 mulheres moçambicanas morrem de causas relacionadas com a gravidez, parto e período pós-natal imediato.
Por: Lédeny Gove